Para não dizer que não falei……..

Depressed Teenage Girl

Eu prefiro não falar desse tema. Dele só se fala baixinho, quase sussurrando. Ninguém gosta de falar dele. É vergonhoso. Imagina se descobrem que alguém da família foi acometido de tamanho mal. O que vão dizer de mim?

O sociólogo Émile Durkheim fez disso o tema de sua pesquisa sociológica. Diz ele que isto acontece sempre que há um estado de anomia na sociedade. Anomia significa ausência de lei, quebra da lei. Ou poderíamos dizer, de uma quebra da lei dentro de si mesmo, psíquica.

Talvez seja por isso. É algo que vai contra a lei. Até boletim de ocorrência tem que fazer. Então é difícil até falar. É como se estivéssemos cometendo um pecado pessoal, social e até espiritual. Quando alguém vive esse drama fora da lei os jornais não noticiam. E se noticiam, dizem que a pessoa foi encontrada. De ativa passa a ser passiva.

Sei que estou enrolando para dizer…. Mas não quero falar. Desse tema só se fala dando voltas, abstraindo, quase dizendo sem dizer, por inferências ou metáforas fora da ordem. Imagino que você sabe do que estou falando, se é que já não desistiu de continuar a leitura.

A questão é que para se chegar onde se chegou a pessoa deu várias voltas e mostras, recados, pedidos de socorro, e não foi ouvida ou entendida. Ou não se sentiu ouvida e entendida apesar dos esforços de quem estava ao lado. Até que chegou num momento sem volta. Então, aconteceu. O que fazer? O que levou a tal ato impensado?

É assim… ela quase disse, deu todas as amostras. Muitas mandam cartas, escolhem os caminhos da execução, preparam o cenário e avisam. Mas quem está ao lado não acredita. Diz de si para si e para outras pessoas, “quem quer mesmo não fala, vai e faz.” Mas não é bem assim.

Se recebo alguém e percebo que sua depressão é avassaladora, pergunto sem rodeios: “Você tem pensamentos de fazer algo contra si? Você pensa em se matar? Você tem planos? O que você pensou? Isto não é indução. O melhor é a pessoa falar para eu poder ajudá-la. Só o fato de falar com alguém, de confiar em alguém já é o início da ajuda à pessoa.

Se alguém chega e diz que vai fazer algo contra si, que já sabe como, e já tem os meios para colocá-lo em pratica, não tenha dúvidas ela vai fazer, aja! Com isso não se brinca. Eu ajo imediatamente. Não quero ter surpresas.

Faço alianças com esta pessoa…Chamo a família e a oriento, e quando não há família chamo os amigos significativos, enfim quem naquele momento pode dar suporte efetivo. Também, encaminho ou levo ao médico ou ao pronto socorro, se não há alguém disponível para isso. Enfim, ajo. A vida é um bem a ser cuidado.

Ah, ia esquecendo de dizer, depois que uma pessoa comete algo contra si, a possibilidade de vir cometer outro ato é altíssima segundo a literatura científica. Então toda ajuda é bem-vinda: as agências de sentido, como as igrejas e instituições de pertencimento, o remédio dado com orientação medica, a psicoterapia, o apoio de amigos e familiares….  Enfim, tudo o que for possível para disponibilizar cuidado efetivo.

É assim a pessoa antes do ato suicida: uma vontade imensa de falar sem se permitir dizer. Uma vontade imensa de gritar sem poder se ouvir, sem se poder dizer, pois lhe falta voz, lhe falta o ar, estrangulada pela angustia que lhe sufoca e quase grita, na ante sala do não ser, em seu estágio final da depressão.

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