“Porque você repara no cisco que está no olho do seu irmão, e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão deixe-me tirar o cisco do seu olho, quando há uma viga no seu? (…) tira primeiro a viga do seu olho, então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão.” Evangelho de Mateus
O que impede as pessoas de se verem e se mostrarem como são nos relacionamentos? Quando um encontro de verdade acontece?
A epigrafe acima fala de uma pessoa com o olho irritado, que esfrega seu olho para se livrar de algo. Ela esfrega, esfrega, e nada. Quanto mais esfrega, mais vermelho fica. Isto a irrita. De repente, ela percebe uma outra pessoa com os olhos ainda mais vermelhos que o seu. “É um cisco!” Esquecendo do seu problema diz: “Deixe-me ajuda-la?”.
Isso pode parecer um grande desprendimento. Mas é uma metáfora de como vemos nossos problemas espelhados em outras pessoas.como se o outro fosse um laboratório, ou espelho, a partir de quem tentamos resolver nossos problemas, sem dor. Freud descreveu esse fenômeno humano chamando-o de transferência. Eu transfiro para o outro algo que em mim é difícil reconhecer.
Nós transferimos problemas, sentimentos, ideias, ou situações. Nesse processo de transferência há perdas. A primeira perda é ignorar a própria dor, o próprio sentimento, aumentando o sofrimento e o desconhecimento de si. A segunda perda é prejudicar o relacionamento, ampliando o distanciamento entre a pessoas envolvidas, trazendo a solidão.
A questão da transferência é sua tendência à repetição. É como se eu ficasse o tempo todo, independente do ambiente ou das pessoas, vendo ciscos nos olhos dos outros. Neste círculo repetitivo o novo sempre me escapa.
A boa notícia é que essa repetição, paradoxalmente, traz uma nota de esperança, a de encontrar alguém que me ajude a lidar com estas forças ignoradas em mim.
